sábado, 10 de abril de 2010

MOCHILÃO PELA EUROPA (PARTE 12: INNSBRUCK)

“Tenha apenas o que você puder carregar consigo. Conheça línguas, países, pessoas. Deixe que sua memória seja a sua mochila.” (Alexander Soljenítsin, dramaturgo, escrito e historiador russo).
   O caminho entre Viena e Innsbruck é muito bonito. Aos poucos o intervalo entre uma cidade austríaca e outra aumenta e quando o cara nota ele já está cercado pelos Alpes (que por mais que só tenham fama se citados juntamente com a palavra Suíços, se estendem, na verdade, por um pedaço considerável da Europa). Enquanto o trem sobe as montanhas, o viajante passa por cidades pequeninas, estações de esqui gigantes – em Salzburg, principalmente -, rios de água recém descongelada e muitas vacas (que são o animal símbolo da Áustria).


Interior de Salzburg
 
   Pra minha felicidade, a Lena (minha CouchSurfing Hostess) estava me esperando na estação. Com um sorriso estampado no rosto. Nem parecia se importar de ter trabalhado até às 21:00 num domingo e ter me esperado até às 22:40, comendo apenas um sanduíche. Sem delongas, caminhamos por uma meia hora até chegar na casa dela, no outro extremo da cidade (que, embora tenha quase 120 mil habitantes, é bem compacta). Fiz questão de pagar nossa pizza de janta e entramos a madrugada conversando sobre rock, olhando fotos e comparando opiniões variadas sobre o mundo.
   A Lena (foto acima) é um pouco mais velha que eu, já começou dezenas de cursos na faculdade, trabalha numa loja de souvenires no centrinho da cidade e já morou na Rússia e na Escócia. Fazia menos de uma semana que ela morava naquele apartamento, que era dividido com mais dois carinhas que eu não cheguei a conhecer. O lugar é meio velho, mas a vista que se tem da janela do quarto dela vale cada ácaro que lá habita.

Da janela do meu quarto vejo, no horizonte, outros prédios

   Dormi umas seis horas e saí cedo com a Lena rumo ao famoso centro de Innsbruck. É lá onde verdadeiras hordas de turistas (especialmente asiáticos) “atacam” com suas temíveis máquinas fotográficas. O ponto turístico principal? Um teto. OK, é um teto de ouro (por isso o nome Teto Dourado). Além disso, o centrinho têm algumas lojas caras, como uma tal de Swarovski – que vende cristais e que designou um segurança a me seguir o tempo inteiro que fiquei lá dentro –, e também a lojinha onde a Lena trabalha. Ajudei-a abrir a loja, atendi um casal mexicano e fui conhecer a cidade.


VALOR AGREGADO

   Fui direto ao centro de atendimento ao turista, que tem belas atendentes poliglotas e que me explicaram como ver as coisas mais legais de lá. Com 25 euros, o visitante compra um passe que pode ser usando em toda a cidade para quase todas as coisas: museus, zoológico, castelos, igrejas, ônibus e até mesmo os bondinhos que te levam lá no topo dos Alpes. Como só a passagem pra esses bondinhos custava 20 euros, me valeu muito a pena comprar este passe. Todavia, meu passeio começou pelos bairros residenciais, que tem casinhas tradicionais e coloridas, além das hospedagens mais baratas. Pra chegar lá, cruza-se o rio da cidade. Não se tem muito pra ver lá, além da arquitetura, como pude constatar.

Casas típicas e rio gelado

   Perambulei um tempinho pelo centro da cidade, mas não quis ficar ali o resto do dia. Especialmente depois do pessoal de um museu da cidade barrar minha entrada lá de mochila e ainda por cima querer cobrar 8 euros para eu guardá-la num armário. Resolvi que era hora de subir as montanhas, fui ao Nord Park.

Centrinho simpático


MANÉS, FRIO, VACAS ALPINISTAS E MISTÉRIO

   Innsbruck fica há menos de 600m acima do nível do mar, mas pegando um bondinho, em 20 minutos, depois de algumas estações, se chega há cerca de 2300m. Daí o tempo muda mesmo. Enquanto lá em baixo estava uns 28 graus, lá em cima não fazia mais do que 5 – era verão, é bom lembrar. Só que o vento, sem dúvidas, fazia com que a sensação fosse algo abaixo de zero. Vestindo toda roupa que tinha, fui subindo.

Reza a lenda que pasto com neve é mais gostoso

   No último bondinho, fui abordado por uma mãe e uma filha brasileiras. Como boas turistas malas, estavam morrendo de saudades do país e de conversar com alguém que falasse português. Ficaram surpresas com o fato de eu estar viajando sozinho e, pior, não ter feito compras. Por fim, já no topo da montanha, ouvi essa pérola antes de dar um jeito de fugir delas:

   Turista-mãe: Tu não quer que eu bata uma foto tua?
   Ger: Pode deixar. Vou fazendo auto-retratos, daí tenho certeza que enquadro o que me interessa.
   Turista-mãe: Ah, mas eu fotografo bem! Eu também faço aaaaaaltos retratos!
   Ger: ¬¬.
   Turista-filha: Mãe, cala a boca! Vamos embora.

   Bobagens à parte, a vista de lá de cima dos Alpes é algo sensacional. Poucas pessoas se prestam a ir até o topo das montanahs, então o silêncio impera. O único barulho é feito pelo vento. Não existe nenhuma cerca ou coisa parecida lá em cima, então a pessoa pode ir por onde bem entender, inclusive bem na beirinha dos penhascos. Lamentei muito não estar com um tênis mais inteiro e apropriado pra andar na neve, pois eu escorregava bastante com o que estava e, assim, não pude andar por todos os lugares que queria. De qualquer forma, algumas das minhas melhores fotos da viagem foram tiradas lá em cima.

Innsbruck


O cachorro ia atrás das bolas de neve que eu jogava


Esse é macho!


Alpes com Ger

Alpes sem Ger


Bondinho começa a descer para a penúltima estação


   Sobre as duas fotos abaixo, não sei muito o quê dizer. Minha intenção era apenas registrar minha faceirice em estar brincando com tanta neve depois de quatro anos, mas o que chama mesmo a atenção é o cara que aparece no fundo da foto. Ele, estranhamente, desafia a lei da gravidade, ao caminhar/deslizar/levitar de um jeito esquisito sobre a neve.

O pior é que eu bati duas fotos e ele seguiu andando daquele jeito


   Gastei todo o resto da bateria da minha câmera lá em cima (por isso, mais do que antes, incentivo vocês a abrirem os links que disponibilizo para que possam visualizar o que descrevo). Foi uma pena eu não ter visto que a bateria estava no fim ao sair de casa, pois eu ainda estava por fazer muita coisa legal.
   Desci uma estação. Há 1905m, fiz uma guerra de neve com desconhecidos, testemunhei a existência de ovelhas com sininhos pendurados no pescoço e já pude tirar o blusão. Depois desci até 860m de altura, onde existe um condomínio de ricaços e restaurantes chiques. Lá, tu pode andar por entre as mansões, se pentear no reflexo de Ferraris vermelhas e até mesmo tentar reconhecer alguma celebridade – mas tem coisa muito mais interessante pra fazer naquele lugar. Um exemplo? Trekking, nem que seja por uma trilha breve, como eu fiz. Peguei uma trilha de cerca de 700 metros, segundo o mapa. Ela iria dar no Zoológico dos Alpes, meu próximo destino. Entrei sozinho no mato e fui indo. O único barulho lá era o meu. E foi assim até eu dar de cara com um enxame de abelhas. Minhas amigas listradas cobriam todo o chão, fazendo um tapete amarelo e preto. Bonito de ver, mas devido às circunstâncias resolvi que era hora de dar meia volta e ir ao zoo de bondinho.
   O Alpenzoo é fantástico! Como dá pra deduzir, só tem animais típicos dos Alpes, como lobos, pumas, ursos, bisões e alces - os meus favoritos. Eu até imaginava o alce como um bicho grande, mas não nas proporções que eu vi lá. Coisa mais massa!!
   Perto das 17h, desci o morro e fui pro asfalto. Cansado, resolvi que era hora de andar de ônibus. É ótimo pegar o bus pra turistas em Innsbruck. Nele há fones de ouvido e cada vez que se passa por um ponto turístico, ouve-se uma breve descrição do local. Dei uma banda por uns 15 minutos e desci na Bergisel - aquela rampa usada para saltos de esqui. Aquilo tinha tudo pra ser chato, afinal não passava de uma rampa, mas até mesmo uma rampa pode ser legal. O visitante pode ir até lá em cima – e o negócio é íngreme mesmo! De lá, tem-se uma vista bem tri da cidade e, depois, ainda dá pra visitar o museu deste esporte (e nesse não tem restrições à mochilas). De tão encantado que fiquei, quase perdi o último bus pro centro da cidade. Desci uma lomba correndo e consegui atacá-lo já uns 100m depois da parada.


A BOCA

   Às 19h, encontrei a Lena e a mãe dela, que tinha ido pra cidade só pra ajudá-la a carregar uns últimos móveis pro apartamento novo. Ajudei a carregar um sofá e mais uma que outra coisa. Daí a mãe dela se foi. Logo depois, a Lena recebeu uma ligação de um(a) amigo(a), pois quando ela me contou quem era ao telefone, em inglês, não tive como decifrar - “friend” é unissex. Era um convite pra uma janta. Pensei: “As austríacas que me aguardem”. Tomei um banho, catei uma calça jeans que (inutilmente) tinha levado junto comigo e fui o mais arrumado possível pra tal da janta.
   Que tristeza. A janta era num microapartamento que um amigo da Lena dividia com outros dois amigos. Havia outros seis caras lá e apenas duas gurias. Detalhe: todos fumavam maconha. A janta? Pão com lingüiça, maionese e tomate. Ao menos a galera era inteligente. Levamos uns papos cabeça sobre política, economia e legalização das drogas com o pessoal, que nem se incomodou com a nossa caretice.
   De volta ao lar, tivemos tempo de trocar listas quilométricas sobre nossas bandas de rock favoritas e, enfim, dormi. Levantei cinco horas depois, me despedi da Lena e com suas instruções sonolentas, e quase corretas, cheguei à estação de trem. Meu destino agora era Zurique, na Suíça.
   Separei as três bandas que achei mais tri da lista da Lena pra compartilhar com vocês. A primeira se chama Maritime e lembra um pouco a Pública. A segunda é a Fuzzman e tem um clipe maravilhoso. A última tem o sugestivo nome de Naked Lunch e usa instrumentos alternativos, como banjo e gaita.

Maritime


Fuzzman


Naked Luch

É BOM TU SABER

   A Áustria tem coisas legais nas cidades, mas o diferencial do país é a natureza. A beleza das paisagens é de tirar o fôlego e o custo pra chegar até lá é o mesmo do que comprar uma camisa com uma vaca estampada em qualquer lojinha pra turista bobo. Quando tu for pra lá, toma vergonha na cara e não fica só fotografando estátuas e torrando teu dinheiro com chaveiros de 5 euros.

Um comentário:

  1. Uhul, agora as fotos abrem aqui na JF! Adoro teus relatos e acompanhar cada detalhe, queria ter essa memória que tu tem! Cada dia dessa viagem deve ter valido por um ano heim! Fico feliz que tenha trazido muito mais que fotos e chaveiros de 5 euros! Beijos!

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