Confesso
que quando vi que estava na hora de eu dominar outra língua além do inglês, eu
fui direto na “mais fácil”, o espanhol. Não teve nada de romantismo na minha
escolha. Atirei-me nesta porque eu precisava de horas complementares pra
faculdade, o idioma era parecido com o português, praticar nos países falantes
não seria impossível (pois não vivo tão longe dos outros países do Mercosul) e,
lááá no fundo, eu nutria certa curiosidade sobre a cultura dos vizinhos de
fronteira. Outra vantagem cômoda de eu estudar espanhol é que este idioma era
ensinado no CCAA, e como passei um pedaço considerável da minha vida dentro
desta rede, eu já sabia que a metodologia funcionava muito bem comigo.
Assim,
no início de 2009, comecei esta significante jornada. Lembro que a minha
primeira turma foi sofrida. Era eu e mais duas tias lá na casa dos seus 40 e
todos. No final do semestre, elas ainda diziam tú és ao invés de tú eres
(e isso é a segunda coisa que se ensina – a primeira é yo soy). Foi um início, no mínimo, chato.
Que burras! Dá zero pra elas. |
Antes
do segundo semestre, realizei
meu sonho de mochilar pela Europa e testei o meu parco espanhol pela
primeira vez. Foi aí que a coisa começou a andar. Pra minha surpresa, já dava
pra ver que o portunhol
estava ficando pra trás. A minha interação com os locais em Barcelona
e Madri
foi muito boa e voltei de lá satisfeito com o meu primeiro teste.
Sagrada Família, Barcelona |
No semestre
seguinte, resolvi pagar um pouco a mais e ter aulas particulares. Foi a melhor
decisão que eu poderia ter tomado. Ainda que as discussões fossem limitadas às
ideias dos professores e as minhas, pelo menos havia garantia que a aula iria
sempre no meu ritmo. E eu sempre tive muita sorte, pois todos os meus
professores eram muito fodões bons. Tive tutores da Argentina e Chile e
outros que viveram no Uruguai, Paraguai e Colômbia. Quer dizer, gente com a
mais variada bagagem de vida e que, sem dúvida, fizeram toda a diferença pra
fazer daqueles momentos a dois o mais agradável possível.
Cada
aula, na verdade, era uma viagem em todos os aspectos. Voávamos pelas paisagens
latino-americanas, salivávamos ao invocar a gastronomia rio-platense e
enlouquecíamos discutindo futebol. Gramaticalmente falando, aprendi, enfim, a
conjugar o tu em português e descobri
que o vós não tem jeito em idioma
algum. Ortográfica e antropologicamente, descobri que muitas palavras (e
atitudes) que só existem no Rio Grande do Sul aqui no Brasil derivam do
intercâmbio cultural travado com nossos hermanos.
Com o Juan, um dos grandes amigos e mestres |
Em
meio a tudo isso, eu pegava a estrada literalmente também. Foram várias as
“escapadas” para a Argentina,
Uruguai,
Venezuela
etc. ao longo dos últimos anos. A cada nova aventura, a sensação inenarrável de
estar constatando ao vivo e a cores a minha evolução e ver a experiência da
viagem cada vez mais intensa. No retorno às aulas, o prazer de poder encher os
pulmões para dizer aos professores que todo o nosso esforço estava, aos
pouquinhos, dando resultado.
¡DALE!
Fazendo justiça |
Quando enfim se aproximou
a data da minha formatura, em meados de 2012, sete semestres depois, não dei muita
bola. Decidi ir à pomposa cerimônia mais em respeito à instituição e
professores mesmo. Contudo, quando me pediram para escolher um professor a ser
homenageado e me peguei num profundo dilema, pois tive tantos dignos disso. Aí
que comecei a notar que o meu envolvimento com todo o processo que me levou
àquela formatura havia sido mais profundo que eu mesmo imaginara até então...
No dia
do evento, quando chamaram o meu nome e recebi o meu diploma, plim!, a ficha finalmente caiu de vez.
Peguei o canudo e me dirigi ao microfone. Todos tinham o direito de falar umas
palavrinhas, mas eu não havia pensado em nada e nem planejava fazer discurso
relevante algum. Porém, agora tudo estava mais claro: eu falava fluentemente um terceiro idioma. E
muito mais que isso: eu tinha ficado ao
longo do processo um pouco mais livre, independente e, consequentemente, feliz.
Eu era uma pessoa melhor por conta disso – e isso, por mais clichê que seja,
não há dinheiro que pague. Senti-me na obrigação de agradecer tudo isso aos
meus pais, professores e amigos. Com a voz embargada, o fiz; e nos olhos
marejados daqueles a quem o meu breve discurso se endereçava, vi que aquilo foi
provavelmente o meu maior acerto em 2012.
Com Carlos e Rodrigo, dois outros grandes amigos-professores |
Aprender
um terceiro idioma foi um meio eficiente e divertido de evoluir – o que sempre
foi o meu objetivo maior, ainda que nem sempre isso esteja tão evidente para
mim mesmo. Muito além de horas complementares, curiosidades bobinhas e
conveniências, ao fim de sete semestres, eu havia conquistado amizades
verdadeiras e descoberto que aquilo tudo era mais um significante passo nesta
maravilhosa crescente que vivo e que aqui imortalizo. J