Fazia exatamente um mês que eu tinha começado a trabalhar. Era uma bela véspera de sexta-feira treze, no longínquo Novembro de 2009. O relógio marcava 23:30 e eu falava com minha mãe ao telefone enquanto passava mel em algumas fatias de pão. Mais uma noite na vida de alguém que morava sozinho e não tinha saco pra preparar algo decente pra comer naquele horário.
Era chegada a hora de tampar o pote de mel sem para de falar no telefone. Tarefa aparentemente fácil, mas que exigia uma concentração muito acima daquela que dediquei. Resultado: meus dedos melados escorregaram no pote, que por sua vez rodou sobre si mesmo por uns dez centímetros em direção à parede, chocou-se contra a mesma e estourou. O que se sucedeu nos segundos que seguiram o crash! foi:
Ger: PQP! Quebrei o pote de mel, mãe.
E AGORA, JOSÉ?
Tenho pavor de sangue. Por isso, pensei: Germano, não te desespera. Se tu desmaiar, ninguém vai te acudir. Tu mora sozinho. Te vira!
Mãe: Te cortou?
Ger: Não. Peraí... Putz, tô vendo sangue. Me cortei sim. Já te ligo, tchau.
Uma quantidade de sangue que eu nunca tinha visto antes jorrava dos meus dedos. Shit!
E AGORA, JOSÉ?
Tenho pavor de sangue. Por isso, pensei: Germano, não te desespera. Se tu desmaiar, ninguém vai te acudir. Tu mora sozinho. Te vira!
Corri por lavabo e no que me virei pra molhar minha mão na pia, chuá!! Sangue voando na parede. Uma delícia.
A água em contato com os dedos cortados ardia horrores. Entretando, eu precisava ver o que tinha acontecido. Só que eu não parava de sangrar. Resolvi então tentar estancar o sangue com uma toalha. Doía, mas era o jeito. Sentei no sofá e liguei pra casa:
Ger: Oi, mãe, tá tudo bem. Só cortei um pouquinho o dedo.
Mãe: Tá tudo bem mesmo?
Ger: Sim, pode dormir. Até amanhã.
Na frente da tevê, segurando a toalha de rosto do lavabo firmemente contra meus dedos cortados, sentia minha pulsação a mil por hora. Tentei me acalmar vendo o Jornal da Globo (pode?!). Passados uns quinze minutos, meus dedos seguiam latejando. Tirei a toalha pra espiar o machucado (até porque eu podia ainda ter vidro nos dedos). O porém: a droga da toalha tinha grudado na carne viva. Aaaaaaaahhhh! Nem olhei direito. Botei a toalha de volta e assisti a mais uns dois blocos do noticiário.
Acabou o jornal. Eu já estava mais calmo e começando a raciocinar, ainda que devagar. Refleti rapidamente sobre o quão ridículo foi o meu acidente e fui pro meu banheiro decidido a tirar (ou desgrudar) a toalha dos dedos, colocar uns band-aids no machucado que eu ainda não tinha visto direito e ir dormir. Arranquei a toalha. Aaaaaaaahhhhh! Sangue. Coloquei o dedo debaixo da torneira. Aaaaaaaaahhhhh! Pelo menos vi o que tanto ardia: tava me faltando um pedaço do dedo anelar direito, do lado da unha.
RUN FOR YOUR LIFE!
RUN FOR YOUR LIFE!
Ainda tentei colocar uns band-aids, mas não consegui. A sangueira não parava – mas eu já estava me conformando com isso. Decidi que já tinha passado da hora de eu ir pro HPS (Hospital de Pronto Socorro) de Porto Alegre. Chamei um táxi e desci com o dedo novamente enrolado na toalha, uns band-aids e um algodão. Mutilado de primeira viagem, pedi pro porteiro do prédio me ajudar a fazer um curativo improvisado pra eu poder abandonar a toalha. Não funcionou. Pra piorar, o táxi ainda demorou longos dez minutos. E quando chegou foi assim:
Taxista (gritando): Meu Deus! Tu tá sangrando, cara!
Ger: Tõ, mas tá tudo bem.
Taxista (com os olhos arregalados): Caiu um dedo teu?!
Ger: Quase, hehe. Foi só um pedacinho, mas tá sangrando bastante.
Taxista (acelerando): Vamos pro HPS!!
Fomos (à 80 km/h na Av. Osvaldo Aranha). Cheguei lá em tempo recorde.
Taxista: Nem precisa me pagar, meu. Só vai lá!
Ger: Capaz, só espera um pouco porque só tenho uma mão pra pegar o dinheiro.
Taxista: Vai lá! Vai lá!
Fui. E, pra minha surpresa, o atendimento foi rápido e eficaz. Em menos de dois minutos eu já estava sentado numa maca recebendo meu atendimento. Ao meu lado, um bêbado fedido esticado numa maca dormindo. Do outro, um cara com um corte monstro na cabeça e um braço enfaixado também dormindo. Diante de mim, um médico bem-humorado:
Médico: Mas tu tirou uma "napa" do dedo!
Ger: Pois é.
Médico: Foi com faca?
Ger: Pior. Foi com mel...
Explicada a história, o médico limpou o local e optou por não suturar meus dois dedos cortados por não haver pele disponível pra isso. Por outro lado, fez um curativo monstro, que deveria ser trocado diariamente até os machucados cicatrizarem e me mandou tomar Tylenol pra dar uma reduzida na dor. Com a promessa que meus dedos um dia voltariam ao normal, agradeci, não precisei pagar nada e fui pra casa.
Era 1:20 do dia seguinte, uma sexta-feira treze, é bom lembrar quando cheguei em casa. Minha adrenalina ainda estava nas alturas e eu não tinha sono algum. As marcas do acidente doméstico estavam por tudo que é canto. O que fazer? Registrar tudo e um dia publicar no blog, ora bolas! Tcharam!!
Lavabo. Destaque o sangue jorrado na parede. Chuá!
Servidos?
Resumindo o fim desta história semi-dramática, trabalhei normalmente no dia seguinte (por opção), fiz curativos em ambulatórios por uns dias, depois pude, finalmente, usar meus band-aids e, por fim, meu dedo voltou ao normal. Hoje em dia, somente armazeno mel em potes de plástico.