sábado, 12 de março de 2011

MOCHILÃO PELA EUROPA (PARTE 20: FINAL)


“Nossas malas detonadas estavam empilhadas na calçada novamente; nós tínhamos longos caminhos a seguir. Mas sem problemas, a estrada é a vida.” (Jack Kerouac, meu guru)

   Liberdade e ter histórias pra contar. Eis dois objetivos com os quais a grande maioria dos jovens (independentemente de sua idade) simpatiza. Ainda que poucos reflitam sobre estes objetivos e outros raros os busquem, cada qual da sua maneira, pouca coisa ainda consegue inquietar a nós, os jovens, como perguntas do tipo Tu é livre? e Qual é o teu legado?
   Juro que pouco pensava nisso até 2005, mas, conforme relatado no primeiro capítulo desta série de relatos sobre meu mochilão pela Europa, as coisas começaram a mudar justamente quando saí de casa e peguei a estrada da vida. Depois de várias experiências de mundo real, uns livros, algumas viagens mais profundas, músicas mais (ou menos) sensatas, pessoas com idéias diferentes e alguns surtos existenciais de pequeno porte, comecei a ter estas questões me martelando numa freqüência crescente. Não sei se isso tudo deveria ter vindo tão cedo na minha cabeça, mas, se não, acredito que tive sorte em ter sido precoce. E, sendo assim, na busca por seguir na construção das minhas respostas e na elaboração de novos questionamentos, decidi ir pra Europa de mochila nas costas ver se na volta tudo ficaria um pouco mais claro.
Ficou.

AIN´T NOTHING LIKE THE REAL THING, BABE
   Nunca tive dúvida sobre o valor de uma viagem e o quanto uma viagem pode mudar uma pessoa. Saindo do ambiente rotineiro, qualquer acontecimento tem outra conotação e impacto. A Martha Medeiros diz que isso acontece porque a gente deixa de ser chato quando viaja. Concordo. Contudo, depois de pensar um pouco sobre isso ao longo dos 39 dias em solo europeu e uns 390 depois daqueles 39, faço questão de completar: o desafio é continuar assim ao voltar pra casa. E como fazer isso? A viagem não pode acabar.
   Esse talvez tenha sido o meu maior aprendizado ao mochilar. Quando se viaja, especialmente quando se mochila só e com objetivos claros, nosso olhar tende a ficar mais aguçado e a mente mais disposta a questionar, comparar e criar. E quando a viagem acaba isso pode (e deve!) continuar. Não há nada que te obrigue a ser novamente complicado. Na minha situação, um viajante solitário, estas análises, pensamentos e questionamentos iam e voltavam na minha cabeça intensamente até que uma hora eu me via obrigado a externá-los para pessoas desconhecidas, sem ter a mínima noção de como uma idéia será rebatida. Fiz isso via CouchSurfing, conversas aleatórias em trens, restaurantes, filas... E (pasme!) foi daí que surgiu a segunda grande descoberta da minha viagem: pessoas totalmente fora da minha realidade são tão (ou mais) legais que aquelas que têm muito em comum comigo. Construí boas teorias para meus questionamentos com a ajuda de desconhecidos que hoje são bons amigos.

ENVELHECI 10 ANOS OU MAIS NESTE ÚLTIMO MÊS
   O grande diferencial do meu mochilão europeu foi exatamente conhecer os desconhecidos dos lugares que eu também desconhecia. Além de ter aprendido horrores sobre tudo que visitei, amadureci, levei ensinamentos muito mais profundos e maravilhosos pra minha vida inteira e compreendi que seria egoísmo puro se os mantivesse apenas para mim.
   Ainda que eu quisesse listar ou discorrer sobre tudo o que aprendi com estas pessoas que caíram de pára-quedas na minha vida ao longo da viagem, não haveria espaço e nem possibilidade ou mesmo razão para traduzir isso em palavras. Porém, apenas pra ficar em alguns exemplos, eu poderia citar a gratidão que sinto pela Anne por ela ter me recebido no seu apartamento de 18m² e também pela Nastasia e sua família por terem me tratado como um Stein de sangue em Bruges, bem como o quanto pude refletir e aprender sobre as barbáries que a indiferença pode causar ao conhecer Berlim inteira sobre duas rodas com o Thomas e da Katja, sem contar as lições de desprendimento que tomei com o David em Zurique ou explicitar de forma digna a forte pulsação de sentimentos que a Federica que me fez sentir em cerca de duas horas no interior da Itália. Deste modo, aprendi também que muitas respostas e novas perguntas podem começar através de uma simples ação, como um corajoso ato de gentileza para com um desconhecido ou dando a cara à tapa na vida, buscando alcançar um sonho, pois o pior que pode acontecer é não dar certo de primeira. Daí é só tentar de novo.

O INÍCIO DEPOIS DO FIM
   OK, Germano, mas tu não ficou deprimido depois de voltar pra casa e encarar tua rotina novamente e ver que todas estas experiências fantásticas agora ficaram pra trás? Sim – e às vezes ainda fico. Mas daí eu me lembro dos meus questionamentos do início deste post e do quão mais próximo eu cheguei das suas respostas até agora. E quando isso ainda não basta, faço um pouco mais de força e me recordo que uma viagem nunca termina, afinal “a estrada é a vida”.

Última foto em solo europeu - Bordeaux, 04/08/2009

Nenhum comentário:

Postar um comentário