domingo, 19 de junho de 2011

2010

   Meu ano de 2010 foi ao mesmo tempo fantástico e lamentável – e por isso mesmo inesquecível. Foi um ano em que empilhei conquistas, mas que não serviu pra eu me orgulhar de todas elas.
   Já estava na hora de eu me formar na faculdade. Embora eu estivesse fazendo o curso de Administração de Empresas dentro dos quatro anos previstos, fazia seis que eu tinha saído do Ensino Médio. E, uma vez que eu tinha um emprego legal e que me dava plena perspectiva de crescimento profissional assim que eu conseguisse ter meu diploma em mãos, não havia razão pra eu não me focar neste objetivo.
   Conciliar trabalho, faculdade, espanhol e vida de dono-de-casa não era novidade e tampouco me judiava. Eu ainda conseguia fazer tudo o que eu queria naquelas horinhas que sobravam nos intervalos entre um compromisso e outro. Só que tudo começou a mudar quando ele entrou na minha vida: o TCC (Trabalho de Conclusão de Curso). 
 
JOGO DOS 5 ERROS
   No começo foi muito tranqüilo escolher um tema, definir o que seria investigado e tudo mais – até porque eu era muito bem orientado. O problema é que ao poucos a demanda aumentava. Com a elaboração do Referial Teórico veio o meu mergulho em livros nem sempre interessantes e cheios de ácaros da biblioteca. Encontrar os autores certos e correlacionar idéias nem sempre é tão simples como parece, mas fui indo escrevendo e reescrevendo o TCC e o ano.
   Veio a metade do semestre, minhas responsabilidades no emprego crescendo, as provas e trabalhos na faculdade se multiplicando e eu me cobrando pra fazer um excelente trabalho em tudo, principalmente no TCC. Naturalmente, (e aí vem o Erro #1) obriguei-me a viajar menos pra minha cidade natal pra tornar meus finais de semana mais produtivos – o que fez com que eu me afastasse de muitas pessoas que gosto. Logo depois, pra render ainda mais, depois do trabalho, ficava na empresa ou estudando ou TCCendo. De lá ia direto pra aula, sem descansar (Erro #2) e me alimentar direito (Erro #3). Eu chegava na sexta-feira à noite sem conseguir pensar mais em nada a não ser na minha cama, até porque eu mal dormia seis horas por noite (Erro #4). Optar por almoçar sozinho e ligeiro (Erro #5) 95% das vezes também não agregou muito pra minha saúde física e mental.
   Ao final do semestre, como de costume, fiquei com notas bem acima da média em todas as matérias, inclusive na que avaliava o que eu havia feito até então no TCC. Também conquistei um herpes no lábio por uns cinco dias, incontáveis enxaquecas, vários quilos (que até o final do ano se somariam sete) olheiras maiores que o normal, uma pilha de temas de espanhol atrasados e, ao menos, uma viagem de 18 dias pros EUA – 7 trabalhando e 11 passeando. Foi o que me deu gás pro derradeiro semestre de faculdade – mas isso é assunto pra outro post.
Era só nisso que eu pensava

NO PAIN, NO GAIN
   Não para a minha surpresa, mas sim para minha decepção para comigo mesmo, repeti os meus erros do primeiro semestre no segundo. Com uma diferença: agora eu ia pra minha cidade natal, só que eu não fazia nada além de dormir, comer, afagar meu cachorro, pesquisar, dissertar e criar e analisar gráficos. Idéias de rever antigos amigos, jogar conversa fora, praticar algum esporte, escrever neste blog, etc. e etc. seguiram escanteadas, pois em qualquer momento que eu tinha livre me vinha o pensamento “Eu poderia estar trabalhando no meu TCC” e lá ia eu. Minhas metas eram tão claras que quase me cegaram.
   Felizmente, havia um outro lado. Eu estava aprendendo muito com o TCC e o meu trabalho. Agora, já pro final do segundo semestre, eu estava ganhando mais no meu trabalho e, o mais importante, estava me vendo aplicar muito do que havia estudado, pesquisado e vivido tanto na vida acadêmica quanto profissional. Isso tudo não tinha preço que pagasse, apesar de que, sob outra perspectiva, estivesse me custando um pouco caro. Afinal, eu tinha noção (e me cobrava por isso) de que eu estava errado e que não estava levando a vida do jeito que eu queria levar.
   Não por acaso, nos idos de Outubro de 2010, já com o TCC bem encaminhado, cheguei perto de um burnout autodiagnosticado. Fiquei uns dez dias sem tocar no meu TCC e ainda abri mão de revisar profundamente tudo o que havia feito até então (não por falta de inspiração, mas por não querer mais gastar a minha transpiração naquilo). Minha concentração estava reduzida à quase zero. O TCC, há tempos, já havia perdido o seu propósito (e tanto o seu método quanto eu éramos culpados por isso).
   Além disso, sempre que eu olhava pro lado, eu via meus melhores amigos de classe passando por situação semelhante, cada um dentro da sua realidade. Entretanto foi naquele momento em que estávamos todos beirando alguma espécie de surto psicótico coletivo que admitimos ser a hora de nos aplicarmos uma terapia de grupo dirigida por nós mesmos. Assim, passamos a nos reunir com maior freqüência para, num primeiro momento, puramente blasfemar contra tudo (e todos) que estava(m) nos enchendo e, num segundo, arquitetar os últimos passos deste longo ritual de fim da faculdade – que, certamente, também estava mexendo conosco. Deu resultado! Conseguimos, assim, nos manter focados até o final do semestre, não esganar ninguém, rever alguns detalhes dos trabalhos e ainda descontrairmos um pouco.
Ensaio de Apresentação do TCC

   A última parte, a apresentação do TCC, apesar da ansiedade natural, não conseguiu me tirar o sono – como talvez outrora conseguisse. Montar os slides foi rápido, eu já sabia bem o que tinha que falar e como dizer (afinal, havia passado incontáveis horas em função daquela data) e também sabia que feito aquilo, aos poucos, a paz voltaria a reinar. E foi bem isso o que aconteceu. A apresentação foi boa e o trabalho elogiado. Nem fiquei chateado em ter tirado “apenas” 9,5. Pra mim foi um 10 com honrarias, salvas de canhão e gritos de “hip-hip-hurra”. Meus amigos também tiveram sucesso e, ao fim de tudo, apesar dos pesares, constatamos que o sacrifício foi válido. Não apenas para o nosso aprendizado e amadurecimento ao longo do caminho, mas, principalmente, para vermos cedo, já aos nossos vinte e poucos anos, tudo o que uma vida desequilibrada pode fazer com a gente. Certamente tomaremos muito cuidado para não repetir este erro lá na frente.


Nervoso? Eu?


O FIM DE UMA ERA
   Nas nossas formaturas (a pomposa dos meus colegas e a minha discreta em gabinete) já se podia identificar algo muito além de um alívio no semblante de cada um. Dava pra ver a volta daquele brilho no olhar que andou um tanto quanto embaçado por boa parte de 2010 e que havia sido presente desde o início do curso. Estávamos todos orgulhosos e éramos novamente nós mesmos.
Sentindo o gostinho do diploma

A minha vez
   
   Por fim, mas não menos importante, passados mais de seis meses desde a última aula oficial realizada nas dependências da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, é possível afirmar categoricamente que a teoria sugerida por Piva (2010), que também concorda com Polese, Veríssimo e Longaray (2010), foi capaz de se confirmar em sua plenitude. Nenhum dos referidos autores, conforme os mesmos foram capazes de antever, chegou ao ponto de lamentar não ter mais aulas à noite ou trocar sua janta por um lanche, dormir poucas horas por noite, abandonar o convívio social e escrever textos chatos e maçantes com o simples intuito de gritar para todo mundo ouvir “Graças a Deus, acabou!” e “Amo ter minhas noites, vida e saúde de volta para mim” – como ressalta, de forma sucinta e clara, Piva (2011).

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