quarta-feira, 24 de agosto de 2011

O SOFÁ

 
PREFÁCIO
Esta é a história de um guri e todo o  seu drama para conseguir um sofá novo.

OS PERSONAGENS
Germano (aqui abreviado por G.), o dono do sofá.
Darli (aqui abreviada por D.), a mãe do Germano.
Vendedor (aqui abreviado por V.).
Porteiro do Prédio (aqui abreviado por P.).
Carinha da Mudança (aqui abreviado por M.).
Seu Fiora (aqui abreviado por F.), o pai do Germano.


60 DIAS ATRÁS, EM CARAZINHO - RS
V.: Certo, Germano. Teu sofá será entregue aqui na loja em 25 dias corridos.
D.: Por que vocês não entregam lá no apartamento dele em Porto Alegre?
V.: Porque o fabricante sempre entrega aqui.
G.: Mas é totalmente fora de lógica. O sofá é feito bem na metade do caminho entre Porto Alegre e Carazinho.
V.: É... Mas fica difícil.
D.: Se não for assim, não compramos. Imagina pagar o dobro de frete...
V.: Deixa eu ligar pros caras... OK. Eles vão entregar em Porto Alegre.
G.: Ótimo. Se precisar desmontar o sofá pra levar pra cima, eles desmontam, né?
V.: Não, eles apenas entregam.
G. e D.: Como assim?!
V.: Vão entregar ele montado no teu prédio. Em que andar tu mora?
G.: Sexto. Por quê?
V.: Xiii, eles só entregam até o quinto.
G.: Hã?!
V.: É regra da empresa.
G.: Então não me adianta.
V.: Como assim?
G.: Se não me entregarem o sofá dentro do apartamento, não compro.
D.: Não tem como o Germano carregar o sofá sozinho lá pra cima!
V.: OK, vou tentar convencer os caras a abrirem uma exceção. Mas desmontar eles não desmontam.
G.: Não tem problema. Talvez no elevador ele não entre, mas nas escadas ele passa tranqüilo.
V.: Então estamos acertados?
G.: Sim. Muito obrigado.

Germano e sua mãe vão saindo da loja, enquanto Germano entoa sua mais nova composição Eu tenho um sofá novo.
V.: Germano!
G.: Oi?
V.: Acabei de conferir um email. A cor do sofá que tu quer não tem mais.
G.: Ah, tá?!
V.: Mas tem essa aqui, ó?
G.: Pra mim isso é o mesmo cinza escuro eu tinha escolhido. Mãe?
D.: Não, este é um cinza grafite. Mas vai ficar bem no teu apartamento também.
(Homens apenas conhecem 16 tipos de cores, o resto diferenciam com os adjetivos claro e escuro)
G.: OK. Serve.
V.: Obrigado mais uma vez.

PORTO ALEGRE, 24 DIAS DEPOIS
M.: Alô, Germano. Gostaria de marcar a entrega do teu sofá amanhã, pode ser?
G.: Claro. Confere aí meu endereço...
M.: Confirmado. Vamos te entregar em horário comercial.
G.: Obrigado. Vou deixar as chaves com o porteiro, daí vocês podem levar o sofá pra cima.
M.: Certo. Tchau.

Naquela noite.
G.: Mãe, valeu a pena se incomodar um pouco quando compramos o sofá. Eles vão entregar amanhã, dentro do prazo.
D.: Que bom filho! Parabéns!
(Mães costumam nos parabenizar mesmo quando o mérito não é exatamente nosso – e mesmo quando não há mérito algum em questão)

NO 25º DIA
G.: Porteiro, vou deixar a chave do meu apartamento contigo. Vão entregar o meu sofá novo, daí tu pede pro zelador acompanhar os carinhas. Também chamei uma ONG, que virá recolher o meu sofá antigo. Diz pro zelador também ficar junto, por favor.
P.: Positivo.
G.: Qualquer dúvida, me liga.
P.: Positivo.

Três horas depois.
P.: Alô, Germano! Me diz uma coisa: tu não quer doar esse teu sofá velho pra mim? Ele é muito bonito!
G.: Pode ser. Eu aviso o pessoal da ONG que eu vou doá-lo pra ti.
P.: Bá, muito obrigado.

Naquela noite.
G.: Oi, Porteiro. Deu tudo certo com os sofás?
P.: Positivo. Teu sofá novo entrou no elevador e já tá no teu apê.
G.: Que beleza! Fico feliz que tu tenha gostado do meu sofá antigo também.
P.: Nem vi ele, na verdade. Foi o zelador que me falou que era bonito. Mas depois que te liguei, ele tomou coragem de pedir pra eu doar o sofá que tu tinha me doado pra ele.
G.: ?
P.: Sim! Daí eu disse pro zelador levar o sofá e nem me deixar ver ele – senão eu me arrependia.
G.: Ah, traqüilo então. Boa noite!

Doações à parte, Germano vai até o seu apartamento e encontra o sofá novo todo embalado.
G.: PQP! Tem duas camadas de plástico e mais uma de papelão... Vou buscar a tesoura.

Três minutos depois.
G.: Mas tá estranha essa cor, parece marrom. Deixa eu acender a luz... Ei! Entregaram o sofá errado! PQP! E que mal-gosto de quem comprou esse sofá!

Germano encontra uma etiqueta no sofá.
G.: Alegrete?! Como assim?! Isso quer dizer que se esse sofá tá aqui, o meu tá do outro lado do Estado... Putz! 
                 
Não, não, não.

No poooste!

Pensamentos sombrios começam a passar na cabeça do pobre infeliz.
G.: E se um gordo suado e peludo recebeu meu sofá, gostou dele e resolveu dormir nele pelado?!

26º DIA, 8 HORAS DA MANHÃ – EM PONTO
Germano se apresenta ao Carinha da Mudança e tenta explicar a situação.
G.: ... e por isso eu te garanto que aquele não é o meu sofá. Aquele é muito feio, tem um buraco no braço – que é pra ser estiloso – e é marrom. O meu é cinza escuro e é retrátil. Nem a nota fiscal bate com o adesivo do sofá.
M.: Bem, esse era o único sofá que me entregaram.
G.: OK, mas não é o meu. Já deixei a chave com o porteiro. Por favor, pega ele lá e trata de descobrir onde está o meu.
M.: Tudo bem. Vou ver com a fábrica.

Dez minutos depois.
V.: Alô, Germano. Fiquei sabendo que te entregaram o sofá errado.
G.: Ah, pois é. E eu tenho medo que o meu já esteja quase na Argentina.
V.: Tu pode me enviar as fotos que tu bateu dele, pra eu ter certeza que foi engano mesmo?
G.: Mando. ¬¬

Outros cinco minutos se passam.
V.: Alô, Germano. Acho que eles se enganaram mesmo, mas fica tranqüilo. Se alguém estiver com o teu sofá, a gente pega de volta.
G.: Hum... OK – enquanto lembrava dos sombrios pensamentos da noite anterior.
V.: Os caras da transportadora vão passar lá pegar o sofá errado hoje. Assim que a gente encontrar teu sofá, eu te ligo.
G.: Feito.

Naquela tarde.
V.: Alô. Encontramos teu sofá. Tá na fábrica ainda. Tão acabando ele hoje. Daqui a dois dias tá na tua casa.
G.: Esperarei. Obrigado.

DOIS DIAS (ESTRANHAMENTE JANTANDO NA MESA DE JANTAR) DEPOIS
G.: Porteiro, entregaram o meu sofá certo desta vez?
P.: Acho que sim. Não abri, mas aconteceu bem aquilo que tu disse.
G.: E o quê que eu disse?
P.: Não coube no elevador.
G.: E na escada?
P.: Também não.
G.: Quer dizer que o meu sofá tá na minha garagem no subsolo?!
P.: Isso aí.
G.: OK. Acho que vou ter que levar a tevê pra lá então.

Naquela noite, ao telefone:
F.: Oi, filhão! Entregaram o sofá certo desta vez?
G.: Sim, essa é a parte boa. A ruim é que tu vai ter que vir pra cá uma hora pra me ajudar a tirar os braços do sofá.
F.: Não entrou no elevador?
G.: Nem na escada. Ele tá estacionado na minha garagem. Pra ele caber no elevador, só sem os braços. Traz todas as ferramentas e muita disposição quando tu vier pra Porto Alegre.
F.: Olha, vai levar umas duas semanas...

MUITAS JANTAS SENTADO NA PRÓPRIA CAMA DEPOIS
G.: Diz que é só desgrudar o velcro debaixo do sofá que a gente já enxerga os parafusos.
F.: Os grampos, tu quer dizer.
G.: O cara da loja disse que era velcro.
F.: Ele se enganou.

Passados 136 grampos e já estando o sofá de cabeça pra baixo.
G.: Acho que eram só esses três parafusos.
F.: Então puxa o braço do sofá. Força!
G.: Não tá saindo.
F.: Peraí, acho que tem um outro parafuso lá, ó.
G.: Mas como é que nós vamos chegar lá?
F.: Acho que vamos girar o sofá pro outro lado, daí tu segura ele e eu entro no sofá.

Após muito contorcionismo e levantamento de peso.
G.: Pronto!
F.: Sim, só falta o outro braço agora.

Algum tempo depois.
G.: Oi, mãe! Veio ajudar?
D.: Vim ver se tá tudo bem. Faz mais de hora que vocês tão aí.
G.: Eu sei. Esse sofá vai ter de ser muuuito bom.

Já no elevador.
F.: Filho, tu puxa ele de dentro do elavador e eu empurro daqui de fora.
G.: Entrou todo o sofá?
F.: Não. Vai mais pro canto. Puxa!
G.: Eu já tô virando patê. Não tem como eu ir mais pra trás.
F.: Então sai!
G.: Como que eu vou sair?! Tem um sofá na minha frente!
F.: Eu não vou tirar o sofá agora. Deu trabalho colocar ele aí.
G.: A porta já fecha?
F.: Não.

Esmagado, mas ainda vivo, e já no sexto andar.
F.: Agora é só montar tudo, filhão.
G.: Assim seja. Valeu.

EPÍLOGO
O sofá foi montado com suor e sucesso. Hoje em dia, Germano vive feliz com seu sofá cinza escuro novo e cantarola o hit de sua autoria quando não há ninguém olhando. FIM.

Feitoo!

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